15 de maio de 2009

A improbabilidade poética da comunicação (II)

Ruy Belo - Nada no fundo tinha que dizer-te
e para ver-te verdadeiramente
e na tua visão me comprazer
indispensável era evitar ter-te

Herberto Helder - Por isso é que estamos morrendo na boca
um do outro. Por isso é que
nos desfazemos no arco do verão, no pensamento
da brisa, no sorriso, no peixe,
no cubo, no linho, no mosto aberto
- no amor mais terrível do que a vida.

Al Berto - ouve-me
que o dia te seja limpo
e que a cada esquina de luz possas recolher
alimento suficiente para a tua morte.

Ruy Belo - Mas sabia e sei que um dia não virás
que até duvidarei se tu estiveste onde estiveste
ou até se exististe ou se eu mesmo existi
pois na dúvida tenho a única certeza
Terá mesmo existido o sítio onde estivemos?
Aquela hora certa aquele lugar?

Herberto Helder - Só eu sei que a loucura minou este ser
inexplicável
que me estende nas coisas
a loucura entrou em cada osso
e os campos são o meu espelho.
Esta imagem perfeita arromba os espelhos.
Os nomes são loucos,
são verdadeiros.

Al Berto - apesar de tudo
continuamos a repetir os gestos e a beber
a serenidade da seiva - vamos pela febre
dos cedros acima - até que tocamos o místico
arbusto estelar
e
o mistério da luz fustiga-nos os olhos
numa euforia torrencial

Ruy Belo - Dizia que ao chegar se olhares e não me vires
nada penses ou faças vai-te embora
eu não te faço falta e não tem sentido
esperares por quem talvez tenha morrido
ou nem sequer talvez tenha existido

‘Esperança’, essa coisa de penas feita | Emily Dickinson

‘Esperança’, essa coisa de penas feita – Que assenta na alma – E trauteia a melodia sem quaisquer palavras – E nunca pára, de forma al...