14 de julho de 2009

Ideia do Poder | Giorgio Agamben

Talvez só no prazer as duas categorias inventadas pelo génio de Aristóteles, a potência e o acto, percam a sua opacidade, entretanto transformada em estereótipo, para, por um instante, se tornarem transparentes. O prazer – pode ler-se no tratado que o filósofo dedicou ao seu filho Nicómaco – é aquilo cuja forma é completa em cada instante, perpetuamente em acto. Desta definição resulta que a potência é o contrário do prazer. Ela é aquilo que nunca está em acto, que sempre falha o seu objectivo, em suma, é a dor. E se o prazer, de acordo com esta definição, nunca se desenrola no tempo, já a potência se inscreve essencialmente na duração. Estas considerações permitem lançar luz sobre as relações secretas que ligam o poder à potência. A dor da potência desvanece-se, de facto, no momento em que ela passa a acto. Mas existem por toda a parte – também dentro de nós – forças que obrigam a potência a permanecer em si mesma. É sobre estas forças que repousa o poder: ele é o isolamento da potência em relação ao seu acto, a organização da potência. Apropriando-se da sua dor, o poder fundamenta sobre ela a sua própria autoridade: e deixa literalmente incompleto o prazer dos homens.
Mas aquilo que assim se perde não é tanto o prazer como o próprio sentido da potência e da sua dor. Tornando-se interminável, esta cai sob a alçada do sonho e gera, para si própria e para o prazer, os mais monstruosos equívocos. Pervertendo a justa relação entre os meios e os fins, a busca e a formulação, confunde o cúmulo da dor – a omnipotência – com a maior das perfeições. Mas o prazer só é humano e inocente enquanto fim da potência, enquanto impotência; e a dor só é aceitável enquanto tensão que obscuramente prenuncia a sua crise, o juízo resolutivo. Na obra, como no prazer, o ser humano desfruta enfim da sua própria impotência.

‘Esperança’, essa coisa de penas feita | Emily Dickinson

‘Esperança’, essa coisa de penas feita – Que assenta na alma – E trauteia a melodia sem quaisquer palavras – E nunca pára, de forma al...